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PIONEIROS DA SAÚDE E DA CIÊNCIA

Sérgio Mascarenhas (sm@usp.br)

A história da ciência moderna no Brasil tem incontestavelmente seu início nos primórdios do século XX. Quando me refiro à ciência não se trata de tentativas pontuais isoladas, mas da estruturação de equipes, laboratórios com projetos e missões definidas e, sobretudo, gestão, metodologia de recursos humanos e infraestrutura. A ciência, dessa forma, profissionalizada como atividade social e não apenas individual não é um hobby, mas um compromisso com o desenvolvimento sócio-economico, isto redunda também em mudanças e desenvolvimento cultural. A ciência tem um poder extraordinário de estruturar culturas: como exemplo fundamental na história da humanidade é o caso de Galileu Galilei, que através de uma série de experimentos mecânicos relativamente simples derrubou uma cultura de 2.500 anos (vide nossa crônica publicada no Jornal A Cidade, em 24/02/2008, http://www.jornalacidade.com.br).O que quero dizer com cultura é um conjunto de valores que determinam o comportamento de um grupo ou de uma sociedade inteira, as regras do jogo de interação social e, finalmente, na base de tudo, como se fossem causas primarias verdadeiras, as forças motoras: as necessidades do grupo social para sua sobrevivência ou vantagem evolutiva. Daí o dito popular: a necessidade é a mãe da invenção! No caso do Brasil – o Rio de Janeiro -, então capital do país, sofria no inicio do século XX uma terrível crise com a epidemia de febre amarela, a ponto tal que os navios nem sequer aportavam na cidade. Foi essa tremenda crise que levou ao estabelecimento do grupo de pesquisa de Oswaldo Cruz e à implantação não apenas do Instituto Manguinhos, mas de uma verdadeira política de saúde pública estruturada com metodologia verdadeiramente científica. Pupilo e colaborador de Oswaldo Cruz, Carlos Chagas realizou então uma das mais notáveis pesquisas que por assim dizer, inaugurou com chave de ouro a contribuição científica do Brasil: estudou de maneira mais completa e detalhada toda a cadeia causal da hoje chamada Doença de Chagas, que atinge milhões de indivíduos em todo o mundo, tornando-se um flagelo global. Chagas estudou do vetor, um inseto denominado barbeiro, ao hospedeiro, o ciclo completo, desde os aspectos clínicos até os sociológicos da doença, e isso no modesto vagão de estrada de ferro de uma pequena cidade do interior de Minas Gerais. Um dos trabalhos mais rigorosos e completos da história das doenças tropicais. Verdadeiro marco na história da ciência no Brasil e no mundo. Hoje o Instituto Oswaldo Cruz, em Manguinhos no Rio de janeiro, é uma instituição modelo, com contribuições notáveis que vão desde a pesquisa em medicina molecular, genômica e outras áreas de fronteira até o trabalho notável de educação e difusão da ciência para a população brasileira. Na ilustração minha e de Alfonso, Janus – o deus bifronte - mira o passado com Oswaldo Cruz e o futuro construído com Carlos Chagas. Ilustramos, assim, a importância fundamental da cadeia virtuosa de gerações que cria as escolas científicas e dá sustentabilidade para o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural de um país. Que este exemplo sirva de guia para o governo, as empresas, as universidades e ongs, para apoiarem uma POLÍTICA CIENTIFICA DE ESTADO E SOCIEDADE, que dê continuidade e prioridade absoluta, sem cortes, contingenciamento e hesitações à única via de progresso possível na era do conhecimento e da globalização: ciência, tecnologia e inovação.

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